– O CAMINHO LEGAL DE UMA PELE DE PIRARUCU –
Talvez você não saiba, mas toda pele de peixe pirarucu, para que possa ser comercializada e transportada no território nacional brasileiro, desde as áreas de manejo sustentável até as unidades de processamento de pescado, indústrias e o cliente final, precisa de um registro.
“Mas que tipo de registro é esse?”
Bem, é isso que vamos explicar para você hoje.
Nos anos 1990, a pesca predatória do pirarucu (Arapaima gigas) era recorrente. A falta de monitoramento e fiscalização levou a espécie à ameaça de extinção e à consequente proibição da sua pesca.
Na região Amazônica, o pirarucu não é apenas parte da cultura e das tradições regionais, mas sempre representou o sustento de milhares de famílias, com sua carne alimentando os povos da floresta e as populações ribeirinhas por séculos.
Algo precisava ser feito para manter o equilíbrio: de um lado, a sobrevivência da espécie e, do outro, milhares de famílias cujas vidas estavam ligadas à captura do peixe para seu sustento.
“E como isso foi conciliado?”
Combinando o conhecimento local das comunidades ribeirinhas com o conhecimento científico do Instituto Mamirauá, foi criado em 1999 o chamado Manejo Participativo do Pirarucu.
Com ele, foi implementado o período de defeso anual, que consiste na proibição total da pesca do pirarucu entre 1º de dezembro e 31 de maio na região amazônica, bem como as cotas anuais de pesca seguras, regulamentadas pelo IBAMA (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis), que, após a contagem dos peixes nos lagos das áreas de manejo, podem permitir a pesca de até 30% dos peixes adultos (todos os arapaima com mais de 1,50 m de comprimento são adultos) disponíveis para a pesca. Os outros 70% permanecem intocados para garantir a reprodução da espécie.
E assim aconteceu.
No ano de sua implementação, na Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS) Mamirauá, foram contados 2.507 peixes, atingindo pouco menos de 3.000 kg capturados e beneficiando diretamente 42 pescadores…
Em 2019, quase 500 toneladas foram capturadas, mais de 190 mil peixes foram contados e mais de 1.100 famílias foram diretamente beneficiadas pelo manejo sustentável.
“Ok, mas onde entra o registro da pele?”
Para intensificar e reforçar a fiscalização da pesca e comercialização do pirarucu, o IBAMA regulamentou em 2004 que toda carga relacionada ao pirarucu, desde a área de manejo de origem do peixe até seu destino final, deve ser acompanhada da Guia de Trânsito de Pescado.
Nesta guia, que é o REGISTRO, consta, além da área de onde o peixe provém, a quantidade (por unidade) de peixes/peles, o peso da respectiva carga, qual unidade de processamento de pescado estão saindo, e para qual indústria estão sendo destinados. Além disso, contém também as informações sobre a autorização de pesca respeitando a cota anual e os números de selo individual de cada peixe que está nessa carga.
Isso mesmo: cada peixe contém, individualmente, um selo numerado devidamente registrado no IBAMA, que autoriza sua circulação e transporte desde o local de origem do manejo sustentável até a indústria de processamento.
Vale lembrar que todo pirarucu é pescado pela carne, não pela pele.
A pele é um subproduto da indústria alimentícia.
O que antes era lixo agora é um vetor de mudança na qualidade de vida de milhares de ribeirinhos, pois desde 2008 a Nova Kaeru iniciou um programa com as comunidades ribeirinhas da RDS Mamirauá para utilizar a pele do peixe pirarucu, que era descartada após a pesca para consumo de carne, transformando-se em resíduo ambiental. Mas hoje, e nos últimos 14 anos, tem sido algo transformador na qualidade de vida, representando cerca de 25% da renda dessas comunidades.
Nenhuma pele pode ser transportada ou comercializada legalmente sem as informações do seu registro.
Para não deixar dúvidas:
1 – A comunidade de origem do manejo sustentável não pode pescar o pirarucu sem a autorização da cota de pesca pelo IBAMA;
2 – Após a pesca, o peixe destinado à comercialização é devidamente registrado, com números de selo individualizados para cada peixe e uma guia de carga numerada.
3 – A unidade de processamento de pescado que transportará a carga também deve emitir a guia de trânsito de pescado, que conterá todas as informações sobre essa carga: o local de origem, a quantidade unitária de peixes/peles, peso, números de selos individuais, e qual é o destino da indústria.
4 – A indústria de destino, mesmo após o processamento da pele, deve também indicar, em seus documentos fiscais, as menções ao registro e às guias das peles comercializadas.
É uma rede de informações muito bem alimentada, em que cada ator da operação é estritamente supervisionado pelos outros, para que o desenvolvimento sustentável da espécie seja mantido.
E não para por aí.
Como outro meio de monitoramento e fiscalização, em nível internacional, a Convenção sobre o Comércio Internacional das Espécies da Fauna e Flora Selvagens Ameaçadas de Extinção, CITES, da qual o Brasil é signatário, determina a necessidade de avaliação e emissão de licenças, pelo IBAMA, que autorizam a exportação ou importação do pirarucu.
Vale lembrar que o peixe pirarucu não está atualmente em perigo de extinção (Apêndice II da CITES), mas sua comercialização continua, e merece continuar, com rigorosa regulamentação e fiscalização.
A Nova Kaeru apoia o manejo sustentável do peixe pirarucu e só comercializa peles com o devido registro no IBAMA, além de participar ativamente no desenvolvimento sustentável das pescarias e no apoio às comunidades ribeirinhas.